sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Blasfêmia

Noturnas horas lentas e entorpecentes.
No balcão está sentado, mudo e suado, figura imaginada diretamente de um filme western antigo, tão preto e branco quanto, mesmo à luz fraca e amarela do boteco. Capote, barba cerrada. Mata outro trago.
Entra em assobios, tristes, mas assobios, outra imagem, já esta parece vinda de uma boemia sambista qualquer, aprumado em blusa cinza claro e calça escura. Senta-se em uma mesa. Silva, razoavelmente, uma outra melodia.
- Por Deus, poderia parar com esta merda?
O cavalheiro, sem levantar-se de seu recente aposento, devolve:
- Por mim, continuo.
Calam-se alguns segundos. O primeiro ainda debruçado sobre a madeira plana junto ao copo, sem virar-se. O segundo poucos metros atrás, sentado confortavelmente e encarando o atrevido ranzinza.
- Muito bem, pensa que é Deus. Tenha ao menos piedade, com esse calor infernal, de deixar-me em paz e calar esta aporrinhação.
- E não deveria estar acostumado, um Diabo como você?
Deus aborreceu-se, desistiu de acender o cigarro e saiu. Ao menos serviu para que cessassem as más inerpretadas melodias.
O Diabo agradeceu a Deus (quanta ironia!) e matou outro trago.





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